A VIAGEM
A família de Antonio Meneghelli embarcou em 1.886 num navio, cujo nome não meu recordo, para uma viagem que deveria durar aproximadamente um mês.
Ao passarem pela alfândega, dois guardas revistaram a bagagem e abriram uma canastra onde Antonina colocara um lindo quadro da Madona Adolorata (Nossa Senhora das Dores). Os guardas contemplaram a imagem por alguns instantes e fecharam respeitosamente a canastra, sem tocar em mais nada. Esse quadro sempre esteve na cabeceira da cama de meus avós e ali permaneceu até os últimos dias de suas vidas.
Apesar da angústia, foram dias de muita felicidade, pois a alegria no navio era contagiante. Foram muito bem acolhidos e, embora ocupassem a segunda classe, tiveram tratamento semelhante aos mais privilegiados, com todas as regalias. Rapidamente conquistaram a simpatia de todos.
Polycarpo e HERMENEGILDO travavam amizade com os marinheiros e excursionavam pelo navio. Elvira juntou-se a outras jovens e também divertia-se muito. Antonio jogava cartas com seus companheiros e Antonina fora escalada para abrir massa de espaguete na cozinha, tarefa que fazia com grande prazer, pois era muito habilidosa.
Um elegante genovês, sobrinho do comandante do navio, se apaixonou por Elvira logo que a viu. Assim, propôs a ela e a seus pais que, caso estivessem de acordo, quando o navio retornasse à Itália, Elvira regressaria com ele e ficaria interna num colégio de Gênova, até que ele concluísse seus estudos na Marinha, dentro de dois anos, quando se casaria com ela. No entanto, nem Elvira, nem sua família concordaram com a separação.
O padeiro do navio também se apaixonou por Elvira. Logo ao amanhecer levava deliciosos pãezinhos à mesa da família e não perdia a oportunidade de declarar seu amor por ela. Embora jamais tivesse sido correspondido, ele não perdia a esperança de conquistá-la.
O navio atracou na Ilha das Flores, no Rio de Janeiro, e os viajantes ficaram surpresos ao ver os africanos de pele negra, pois foi a primeira vez que tiveram contato com essa raça. Nem imaginavam que pudesse haver raças tão diferentes no mundo. Os negros ofereciam suas mercadorias, principalmente abacaxis e jacas, que os viajantes acreditavam tratar-se de gigantescos figos da Índia.
Os dias foram passando e as jovens e suas mães tricotavam e bordavam. Havia um casal que viajava com duas meninas vestidas com tanto tricô feito no navio que até pareciam duas bolas andantes!
No final da viagem, ao retomar suas bagagens, Polycarpo notou com tristeza que o caixote com os livros que ganhou do professor havia sumido.
Ao despedir-se, o padeiro insistiu no seu pedido à Elvira, declarando que, caso ela o aceitasse, ele deixaria o emprego. Ela, no entanto, respondeu-lhe francamente que não deveria perder o emprego por sua causa, pois ela não o amava e, portanto, não poderia corresponder-lhe.
CHEGADA AO BRASIL
Hospedaria dos Imigrantes
Hospedaria dos Imigrantes
A família desembarcou no Porto de Santos e, por ordem do consulado italiano, foram de trem até São Paulo, onde se instalaram na Hospedaria dos Imigrantes à espera de seguir seu destino. Na ocasião lhes foi devolvido o dinheiro das passagens, sem que entendessem o porquê. Na verdade, por terem sido incluídos como imigrantes, receberam esse benefício.
Passados alguns dias, o padeiro apaixonado foi visitá-los, afirmando que, por causa de Elvira, desistira do emprego e seu navio já partira. Dizia que não se conformava por ela não lhe corresponder e lastimava, finalmente, por estar sem ela e sem o emprego. A linda jovem, então, lhe respondeu: "Nunca alimentei suas esperanças. Ao contrário, o aconselhei a não deixar o emprego. Você fez isso porque quis". Sabendo que a família seguiria em direção à cidade de São Carlos, o padeiro ainda insistiu, dizendo que a escreveria e que, caso mudasse de idéia, imediatamente iria vê-la.